(Por Fernanda Dourado) – coluna publicada na Tribuna da Bahia nesta quarta-feira (15)
A pouco mais de um ano e meio das eleições majoritárias de 2026, o cenário político da Bahia já se desenha com tensões, reposicionamentos e movimentos que mais se assemelham a uma intensa partida de pôquer. No centro desse tabuleiro, o nome de ACM Neto — ex-prefeito de Salvador e vice-presidente nacional do União Brasil — ressurge como possível pré-candidato ao governo do estado. No entanto, sua jornada está longe de ser tranquila.
Após a derrota em 2022, ACM Neto optou por uma reclusão estratégica. Suas aparições públicas diminuíram, suas críticas ao governo petista de Jerônimo Rodrigues cessaram por um período e, para muitos, isso simbolizou um momento de reflexão. Contudo, a política não é paciente com o silêncio. Em um ambiente onde a percepção e o simbolismo valem tanto quanto as ações concretas, o afastamento de Neto gerou desgaste dentro de seu próprio grupo político.
A oposição baiana, liderada historicamente por ACM Neto, vive hoje um processo de esvaziamento. A debandada de prefeitos e aliados revela fissuras internas que se tornaram mais evidentes com críticas públicas, como as do prefeito de Luís Eduardo Magalhães, Junior Marabá, e do deputado estadual Paulo Câmara (PSDB). Ambos aliados de Neto, não pouparam comentários sobre a ausência de articulação e o distanciamento pessoal do líder.
“Ninguém recebe o que deveria ser o mais simples: uma ligação.” A frase atribuída a um dos primos de ACM Neto, o empresário Luís Eduardo Magalhães e neto do falecido deputado Luís Eduardo Magalhães, ecoa nos bastidores como símbolo de um dos maiores erros políticos: subestimar a importância da escuta e do contato direto com as lideranças que, no final das contas, sustentam qualquer projeto eleitoral viável.
A crítica não é nova. Em 2018, Neto já havia frustrado aliados ao anunciar sua desistência de disputar o governo da Bahia. A justificativa — de que seguiria seu coração e permaneceria como prefeito de Salvador — não foi suficiente para apaziguar o sentimento de abandono entre prefeitos, deputados e lideranças do interior.
Esse padrão de comportamento, apontado por muitos como “centralizador e indeciso”, volta a ser explorado agora por adversários, que usam antigos aliados como peças estratégicas para minar, desde cedo, qualquer tentativa de reconstrução do seu nome como liderança estadual.
Ainda assim, seria precipitado descartar ACM Neto do jogo. Jovem, experiente, com forte recall eleitoral e dono de um projeto político de longo prazo, ele conhece as regras da política baiana como poucos. Neto carrega o peso simbólico do avô, o ex-governador e senador ACM, e sabe que a cadeira do Palácio de Ondina ainda representa um sonho pessoal e uma meta inacabada do seu grupo.
Em 2022, mesmo diante de um cenário adverso e da força da máquina estadual e federal do PT, Neto obteve 47,22% dos votos, perdendo para Jerônimo Rodrigues (PT), eleito com 52,78%. A margem apertada, considerando que o petista começou a corrida praticamente desconhecido da maioria dos eleitores, revela algo importante: ACM Neto tem força, voto e estrutura. Foi uma derrota política, mas não eleitoral no sentido mais amplo — ele mobilizou milhões de eleitores, espalhados por todo o estado.
Mas é preciso reagir. A política não dá sobrevida a projetos que se alimentam apenas de passado. A reconstrução de sua liderança exige mais do que memória de bons governos ou capital simbólico familiar. Exige presença, escuta ativa, reorganização do grupo, fortalecimento das bases e, acima de tudo, uma nova narrativa. Se ACM Neto quiser voltar a ser protagonista, terá que deixar de ser apenas lembrado — e voltar a ser necessário.
Fernanda Dourado é editora-chefe do site Bahia Repórter, consultora e especialista em política, há mais de 20 anos. A jornalista é apresentadora e repórter da TV ALBA – Assembleia Legislativa da Bahia – onde apresenta programas políticos desde a fundação da emissora. Escreve neste espaço às quartas-feiras; Instagram e TikTok: @fernandadouradoreporter